Dungeon Capturer ♦ Parte 1 - Dantalian ♦ Missão para Takane Shion, Arya Starlust e Lyon Walker

- O que é aquilo?

- Miasma - a menina murmurou.
Ela não percebeu que Momo e Lyon nunca chegaram aonde estavam.
Haruka saltou para os braços dela e Takane o acariciou, suas mãos estavam tremendo e ela estava bem irritada.

- Um amontoado de sentimentos humanos corrompidos - a garota explicou, olhando para as motos - Chegamos ao nosso objetivo. Não vamos mais precisar disso. Haruka, você vai ficar assim mais um pouco ou...?

- Não... eu quero ter certeza que estamos sozinhos.

- Ok - a menina suspirou, pensando no que teriam que fazer a seguir. Ela estava começando a ficar com sono e sabia que os outros dois não eram de ferro - Me ajude a rastrear um lugar bom para dormir.


As habilidades de sobrevivência dos dois era, bem... animalesca.
Em menos de meia hora, Takane e Haruka acharam um bom lugar para acamparem. Era perto de um pequeno lago, um espaço sem árvores mas estas ofereciam relativa proteção contra olhares curiosos e o clima.

A garota parecia satisfeita.

- Não faço a minima ideia de como será a entrada da Dungeon - ela admitiu, dando ombros - Vamos ter que procurar amanhã. Haku, Haruka... acendam um fogo. Eu e Arya vamos procurar algo para comer!

- Então, como fazemos pra fazer a fogueira?

- Bem... vamos precisar de lenha - ele deu ombros, já em sua forma humana. Os traços do garoto realmente pareciam os de uma raposa, se você olhasse bem, mas Haku não estava preocupado com nada disso - Posso remover... você sabe? Não sito o cheiro da Deviluke.

Ele apontou para menino e fez um gesto ligeiramente vago. O garotinho fez um sinal positivo para Haruka e em pouco tempo ele estava em sua forma normal.

O menino de olhos cinzentos foi o primeiro a levantar e ajudou o outro a fazer o mesmo. Haku respondeu a aquilo tudo com uma careta.

- Dor muscular é um dos sintomas de usar transfiguração por períodos longos de tempo sem ter pratica previa - ele explicou com um pequeno sorriso piedoso. Ele meio que já havia se acostumado com aquilo, mas o outro... - É como se você tentasse correr uma maratona, mas tivesse passado a sua vida inteira trancado em casa. Vamos?

Os dois procuraram nas proximidades da clareira, não se afastando muito mais que duzentos metros e reuniram os galhos secos que conseguiram encontrar.
Haruka os ajeitou no lugar mais protegido do pequeno acampamento e em poucos minutos eles encararam uma obra prima da arte de arrumar madeira para produzir uma fogueira.

Só não havia nada que pudessem usar para criar fogo.
Pequenas esferas criadas de chamas saltaram para os galhos e em pouco tempo, eles tinham cumprido a tarefa lhes dada por Takane. O garoto mais velho sorriu e se encostou em uma árvore coberta de musgo confortável e macio, seus olhos brilhando na escuridão.

- Eu realmente tenho inveja da sua relação com a Arya - ele comentou de repente, com um pequeno sorriso amarelo no rosto. O menino olhou para o céu estrelado - Se eu tivesse metade... não, um quarto da sua determinação, havia me esclarecido com aquela garota há muito tempo atrás...


- Então... você e Haruka se conhecem há muito tempo?
Aquela brusca quebra no silêncio assustou Takane. Ela parou por um momento, após ter perdido o cheiro que estava usando como referencia por um instante. Era de um coelho ou coisa assim.

- Ele me conhece a muito tempo, mas eu? - ela deu uma risadinha. Com medo de quaisquer predadores da floresta, orelhas de lobo saltaram de entre os cabelos da menina. O filhote de lobo se virou e encarou a outra - Uns dois anos. Acho que fará três anos que nos conhecemos esse outono. É estranho, sabe... pensar que estaríamos nos formando na primavera e indo para a faculdade se tudo fosse normal. Eu estou realmente feliz que as coisas tenham acontecido do jeito que foram, caso contrario eu não teria conhecido a pessoa que me tirou das trevas. Se bem que eu estava perdida por causa do mundo no começo da história...
Ela havia se perdido em pensamentos. Takane corou e parou bruscamente de falar.

- Eeeeeeeeehhh?! Você gosta da Arya?

Haruka começou a rir, mas naquele mesmo instante ele começou a ter um acesso de tosse. A dor invadiu o seu corpo, como se as suas entranhas estivessem em chamas, tipica daqueles pequenos ataques. Ele se dobrou ligeiramente sobre o seu corpo e tampou a boca com a mão.
Quando ele voltou ao normal, mas a sua respiração não passava de um chiado, ele escutou as outras palavras de Haku.

- Q-quer dizer, eu n-nem sou tão determinado assim... M-mas se quiser ajuda eu estou à disposição...

- Você entendeu errado - o menino mais velho forçou-se a sorrir. Ele não sabia que tipo de expressão havia sorriso, pois cada célula gritava em pânico e protesto. O garoto não podia se mover propriamente; o menor gesto lhe causava sofrimento. Mesmo assim, ele se forçou a continuar a fingir que estava tudo bem - A pessoa de quem eu gosto é T-T-T-T-T-Tak... EugostodaTakane!

Ele falou aquilo tão rápido que a sua fala poderia ter sido confundida com um espirro, mas o seu rosto estava tão corado que era impossível confundir com outra coisa. De certa forma, parecia aqueles personagens de desenho quando eles ficam envergonhados e fumaça sai de seus rostos; aquilo descrevia a situação de Haruka.
Ele desviou o olhar e encarou algum ponto escuro da floresta ao anoitecer. Abraçando os seus joelhos, o menino tinha uma aura... diferente. Se Takane estivesse ali, ela poderia ter dito era de certa forma nostálgico tudo aquilo.

Ele parecia... sério. Sério e maduro. Ele tinha as suas inseguranças e aquilo era especialmente vergonhoso de se falar para outras pessoas, mas o garoto parecia passar um certo sentimento de tranquilidade.

- Mesmo assim, não é exatamente como em um livro onde dizem como é a relação certa e saudável de um garoto e uma garota. Nós... nós passamos muitas experiencias difíceis juntos. Aprendemos a sobreviver um com o outro, sem mais ninguém - havia um pequeno sorriso em seus lábios, mas que brilho era aquele em seus olhos? Dor? Medo? - Até que eu me descuidei. Ela... ela foi levada para longe de mim. Se isso não tivesse acontecido, eu me pergunto se teria sido diferente. Mas agora eu a reencontrei, mas não posso falar nada, pois eu a abandonarei em breve. E... e isso dói. Machuca estar longe dela, mas estar perto de Takane e não ser do jeito que eu quero é dez vezes pior. E eu sei que por mais que isso soe egoísta, você também se sente assim com a Arya, não é?


Qual era a sujeira daquele mundo sujo?
Para a raça humana, simplesmente era tarde demais.

- Takane-chan, eu não quero ser intrometida mas... você gosta do Haruka-san, não gosta?
Uma pegada que deveria ter sido feita por alguém com a força de um monstro ficou no chão.

- Não é exatamente gostar - Takane explicou, mas naquele momento, a temperatura do lugar começara a cair. De inicio bem devagar, a despeito do rosto da menina que ficava cada vez mais vermelho - É... é algo maior que isso, mas...

E naquele instante, a temperatura pareceu baixar uns dez graus ou coisa assim.

- O meu coração é feito de pedra ou alguma coisa assim - ela passou a andar, sua postura um pouco diferente da anterior. Se antes ela era uma garota incerta, agora era alguém totalmente fria - Se eu desaparecer sozinha em algum lugar será mais fácil ou coisa assim? Mesmo eu querendo saber a verdade, estou coberta em mentiras e cheia de veneno. Eu sou diferente de você e de Haku, Arya. Eu não posso amar. Os meus sentimentos em relação a Haruka... - no segundo que ela disse esse nome, algo pareceu se alterar no véu de inumanidade que havia descido sobre Takane. Ela parecia quase... feliz, ou alguma coisa assim - Eu simplesmente fico mais contente em pensar que eu posso ter um futuro e uma vida com ele que com qualquer outra pessoa. É... é só isso.

Um clima indefinido se instalou entre as duas. O filhote de lobo parecia distante, como se estivesse separada dá outra por uma imensidão de quilômetros. Como se fossem duas garotas de países com línguas e costumes diferentes.

- O que você está fazendo com Haku... parece ser realmente cruel - Takane disse por fim, com uma nota enigmática em sua voz sem emoções - Com vocês dois. Aquele garoto provavelmente te ama e qualquer criança perceberia que isso é mutuo. Por que você não diz para ele?

- Está brincando? Eu... eu amo a Arya, Haruka. Entendo perfeitamente como você se sente - o garoto mais novo fez uma pausa antes de continuar. "Amar"; quantas vezes ele se perguntara se compreendia aquele sentimento perfeitamente? Ele e Takane eram crianças e admitiam isso; criaturas novas em um mundo velho. E então? Era esperar demais que pequenas raposas e jovens lobos sobrevivessem muito sozinhos como estavam no momento - É como fôssemos estrelas... Tão perto, e ao mesmo tempo, tão longe. Machuca ficar longe dela também, mas, por mais que seja mias doloroso ficar perto sem ser do jeito que eu quero, eu ainda prefiro assim. Seria bem pior se me mantesse longe e algo acontecesse a ela... eu jamais me perdoaria. Ou ficasse longe pensando em como seria se eu estivesse lá. Por isso, eu vou aproveitar cada momento em que eu permanecer ao lado de quem gosto.
Haruka deu um pequeno sorriso. Ele compreendia exatamente o que o menino dizia, mas era um pouco mais complicado que aquilo. Ele podia morrer amanhã o que tornava mais fácil de aproveitar o "agora". O menino-raposa vivia sob uma filosofia de não pensar no amanhã, sobreviver um dia de cada vez e assim, viver sem arrependimentos.

- Eu também não acho isso nem um pouco egoísta. É tão egoísta assim querer ficar perto da pessoa que você ama? Eu me pego perguntando às vezes, se ela sente o mesmo... - o guardião desviou o olhar mais uma vez.
Para ele, era. Cada instante que passava perto de Takane fazia a menina se machucar cada vez mais e aumentaria a dor que ela sentiria no fim.

- Mesmo assim, não é exatamente como em um livro onde dizem como é a relação certa e saudável de um garoto e uma garota. Nós... nós passamos muitas experiencias difíceis juntos. Aprendemos a sobreviver um com o outro, sem mais ninguém - havia um pequeno sorriso em seus lábios, mas que brilho era aquele em seus olhos? Dor? Medo? - Até que eu me descuidei. Ela... ela foi levada para longe de mim. Se isso não tivesse acontecido, eu me pergunto se teria sido diferente. Mas agora eu a reencontrei, mas não posso falar nada, pois eu a abandonarei em breve. E... e isso dói. Machuca estar longe dela, mas estar perto de Takane e não ser do jeito que eu quero é dez vezes pior. E eu sei que por mais que isso soe egoísta, você também se sente assim com a Arya, não é?

- Hey, provavelmente o mesmo está se passando por sua cabeça então eu vou falar de uma vez. Eu não conto pra Arya porque sou idiota o suficiente pra esperar que ela me corresponda, mas você, por que não diz nada pra Takane?
Aquela pergunta pegou Haruka de surpresa. Era apenas uma das variações do que já o haviam questionado uma centena de vezes. Ele deu um sorriso triste, porém determinado, como se já tivesse aceitado muito bem o seu destino. Sim, ele já... já havia aceitado aquilo há muito tempo. Era por causa daquilo que ele também se machucava perto de Takane.

- Porque... eu vou morrer - ele notou a expressão no rosto do outro rapaz e desviou o olhar para um canto do céu onde estavam poucas estrelas, suspirando. Não era a primeira vez que via a Via Láctea daquela maneira, mas ainda era bem incrível - Com muita sorte, talvez eu chegue aos vinte anos, mas é impossível que eu não morra antes dos trinta. Talvez eu morra amanhã, não sei. Então... eu tenho que continuar vivendo sem nada que eu possa me arrepender - Haruka entrelaçou os dedos na frente do peito e continuou a olhar a noite, com uma expressão de infinita tristeza em seu rosto - Digamos por um instante... que Takane aceitasse os meus sentimentos. Nos tornaríamos um casal. E então, a coisa daria certo por um ano ou dois. E então é provável que eu morreria e a deixaria sozinha. É por isso que eu não digo nada; para não piorar a dor que ela sentira quando eu finalmente a deixar e isso provavelmente vai ser antes do esperado.
Ele desviou o olhar para as chamas, finalmente, e teve coragem de subi-lo lentamente até encarar Haku nos olhos. Suas íris cinzentas pareciam... diferentes. Como de um tom rosado de vermelho. Mas provavelmente era efeito do reflexo do fogo.

- Mas a verdade é que... faz cinco anos que eu estou perdidamente apaixonado por aquela garota. Se ela me negar e me abandonar, é provável que eu me perca em trevas - ele deu um suspiro, fechando os olhos momentaneamente - E quanto a Arya... sinceramente, você é um idiota. É claro que ela te ama também e se te rejeitar, é porque tem um ótimo motivo por trás disso e provavelmente nada vai mudar entre vocês. E Haku... diferente de mim, você tem tempo. Por isso que eu tenho inveja de você. Você pode encarar tudo isso de frente, eu não. Na realidade... se eu fosse você, iria correndo contar isso para aquela menina.


- Haku... me ama? E-eu não sabia....

- Sinceramente, garota, você é bem lenta - censurou o filhote de lobo, cruzando os braços. Ela estava começando a ficar irritada - E se você responder que ele precisa de alguém mais parecida com ele, eu vou te bater.

A menina voltava ao normal aos poucos e Takane a esperava em pé, pronta para recomeçar a andar.

- Você disse que o que é cruel... entretanto, não é cruel com você e o Haruka também? Eu sei que para que ainda não estejam juntos deve ter uma boa razão, e também não é da minha conta mas... De algum jeito, ver vocês juntos parece ser a forma certa de ver as coisas...
Arya disse aquilo com um sorriso e corando, mas a expressão no rosto de Takane era um pouco alarmante. Ela simplesmente encarava a menina mais nova, seus olhos brilhando com uma luz dourada no meio da noite, como os de um lobo.
E a emoção neles...
Não existia.

- Me desculpe, eu acho que estou sendo intrometida falando essas coisas...

- Isso é verdade - não havia nada que pudesse indicar humanidade na voz da mais velha. Era como o som que um lobo ou um gavião emitiria, parecido com uma lagoa; límpido, claro, frio. E ela não fazia nada, simplesmente encarava a outra - Mas você quer saber? Você nunca entenderia a história completa se eu te fizesse, mas vamos colocar assim: eu não quero ser responsável por trazer Haruka para as trevas - naquele ponto, já era possível ver uma vasta tristeza na voz da menina. Mesmo assim, seus olhos continuavam frios - Se ele aproximar demais... eu sou suja, você já pode deduzir o que acontecerá. Eu não quero me tornar a luz também. O que eu desejo é a escuridão. Assim... assim eu posso me esconder. Me esconder ele poderá brilhar. É um sonho terrivelmente egoísta, mas é assim que eu tenho vivido.

Takane suspirou e pela primeira vez, Arya viu um esboço de um pequeno sorriso no rosto da menina, mas ele logo se apagou.

- Eu tento justificar as minhas ações dizendo para mim mesma "É para o bem de Haruka" - ela explicou, a sua voz mais e mais perdida em meio a tristeza que ela sentia - Mesmo assim, não sei se acredito mais nisso. Eu simplesmente não quero que ninguém tenha que sofrer igual ele e para isso, eu acabei me perdendo. Sou patética, não?

E com aquela nota enigmática, ela voltou a andar lentamente.

- Eu sei que não conheço muito sobre o mundo, nem que minhas palavras possam significar algo... mas, Takane, eu não te acho patética. Você está tentando protegê-lo eu.. entendo como você se sente de certa forma. Só não acho justo que você se perca. Quando se gosta de alguém, independente do sentimento que seja, eu acho que os dois lados devem ser felizes... que os dois lados possam... brilhar...

- Você realmente sabe pouco sobre o mundo - disse Takane, com um riso seco. Ela ficou feliz que estivesse na frente, assim a mais nova não tinha que ver a sua expressão de tristeza - É a lei do mundo. Se você deseja esperança, a felicidade desaparece e é substituída por uma quantidade equivalente de desespero. É assim que as coisas funcionam. Para que Lyon fosse feliz, você teve que sofrer. Para que vocês dois vivessem no conforto, eu e Haruka tivemos que perder coisas importantes para nós dois. Esse é o irracional "sistema" do mundo.

Com um suspiro profundo, o filhote de lobo olhou aos arredores farejando. Havia alguma coisa por ali?
Então ela sentiu um cheiro. Com um pequeno sorrisinho no rosto, ela passou a guiar Arya para lá, porém os seus sentimentos de depressão continuaram levando a melhor.

- É uma troca equivalente - explicou Takane triste, brincando com uma folha que havia caído na sua frente - Haruka já suportou a minha dor uma vez, quando eu mal conseguia andar. Eu... eu preciso retribuir o favor. Apenas não sei como.

Ela parou. Lagrimas começavam a se formar nas beiradas de seus olhos, se lembrando de Haruka no leito de hospital.
- Por que eu sou tão inútil? Eu sempre estive sozinha e mesmo agora, não sou capaz de causar outra coisa além de infelicidade. Mas ele ficou do meu lado, mesmo sabendo que iria se machucar. E então... eu não pude fazer nada!


- C-como você sabe que ela me ama? ... Eu não tenho tanta certeza se tenho coragem.. Não agora.
As chamas pularam de maneira perigosa na fogueira. A expressão de Haruka era séria, como na hora que ele havia jurado Egil de morte.

- Você é idiota? - sua voz estava tão livre de emoção que mal parecia o mesmo menino inocente de antes. Os seus olhos agora refletiam as chamas mais amareladas - Se o que te falta é "coragem", você veio para o lugar errado. Isso significa que você é simplesmente muito estupido. Você provavelmente vai arriscar a sua vida na Dungeon; ninguém nunca saiu vivo de lá.

Seus olhos mostravam perigo.
- Se isso não é "coragem" é simplesmente idiotice de alguém que não dá valor a própria vida. Do jeito que está, você vai machucar Arya. Você não tem nenhum motivo para esconder e pode estar morto amanhã pela própria escolha - o tom que Haruka usava era assustador de certa forma. Seus olhos dourados pareciam brilhar na escuridão - Não fale mais comigo se isso é tudo o que você consegue fazer. Se você quiser morrer, me fale que acabo com você na hora. Mas lembre que nessa viagem, há várias pessoas que invejam uma vida como a sua.

- Algo mais a dizer?
Haruka estava basicamente se contorcendo de rir nesse ponto.
Não que ele estivesse fazendo graça do garoto. A situação em si era muito engraçada.

- Interessante! - ele tentou ficar sério um momento, mas um largo sorriso ainda dominava a face do menino, seus olhos cinzentos possuindo um sorriso travesso - Você tem mostrado "olhos" interessantes nos últimos tempos, agora eu tenho certeza que eu não me enganei. Se essa é a sua "determinação", me mostre as suas "capacidades" amanhã. Eu ia perguntar se você lutaria junto comigo, mas não é um pouco tarde para pensar nisso? Vamos, simplesmente venha conosco.

Ele deu ombros, então voltou a rir.
Mas a sombra da morte pairava sobre ele aquele dia, também.

Novamente, o sorriso do menino se fundiu com o acesso de tosse. Ele caiu de joelhos, sem conseguir levar o ar para os pulmões direito. Seus olhos começaram a lagrimejar e uma sonolência razoável passou a tomar conta da sua mente.

"Não é tão mal, não é?"
Ele piscou.
Fechou os olhos.
Sua face indo rapidamente em encontro ao chão...


- Sinto muito Takane-chan.... mas, você não causa só infelicidade. Eu não estou infeliz aqui com você.

- Hã? - ela parou e encarou a menina, se virando bruscamente. Seus olhos pareciam brilhar ainda mais por causa das lagrimas que se acumulavam neles - V-Você está aproveitando? Está se divertindo? Como... Espera!

No meio da floresta, havia algum doido dirigindo entre as árvores e quase batendo várias vezes. Takane massageou a testa impacientemente e sequer queria olhar para o grande idiota.

- Isso é... o que estou pensando que é?

- Eu estava tão feliz que ele havia nos abandonado... - o filhote de lobo suspirou, irritado. Ela passou a mão no cabelo, pensativa e por fim tomou uma decisão - Quer saber? Ignore. Apenas continue andando que é melhor.

Que tipo de destino era aquele?
A menina só sabia que corria, corria e corria.

De novo.
Por que aquilo estava acontecendo de novo?

As lagrimas escorriam de seu rosto enquanto ela lutava contra o tempo. A única coisa que passava na sua mente é que ela precisava alcança-lo.
Sempre fora assim, no final.
Eles diziam estar sozinhos e que queriam apenas conhecer um ao outro, mas na realidade...
O que acontecia na realidade?

Ah...
Entendi...
Na realidade, nós...

Aqueles eram os verdadeiros sentimentos dela, ou algo assim?
Mas Takane não entendia nada.
"Takane-chan, eu não quero ser intrometida mas... você gosta do Haruka-san, não gosta?"

Se aquela menina gostava de Haruka, ela gostava de Tateyama Ayano também. O filhote de lobo nunca conseguiu destingir direito a relação que ela tinha entre os dois.

Ayano havia morrido.
Haruka quase havia morrido com ela.

Era essa a diferença entre Kokonose Haruka e a garota chamada Ayano.

Mas agora...!

Eu sou tão idiota...

O fogo havia queimado e se apagado, deixando apenas aquela fortaleza de gelo.
Então aquele simples problema ia se colocar no caminho dela até o fim, não é?

- Fique longe dele!
Enomoto afastou bruscamente o braço de Haku. Em situações normais, ela tentaria esconder as lagrimas, mas quaisquer regras que ela tivesse imposto sobre si mesma estavam revogadas naquele instante.

O corpo da menina tremia da cabeça aos pés.
Ela estava assustada, verdadeiramente assustada.

Takane sequer conseguia gritar com Lyon. A única coisa que lhe importava agora era Haruka.
Sempre fora.

Ele sempre estivera lá.
Agora era a vez dela estar lá por ele.

- Ele é meu! - a menina estava basicamente as lagrimas quando gritou aquelas palavras - Haruka é meu! Não o toque!

Por mais que ela parecesse frágil, havia algo diferente em seu olhar. Falando nisso, seu olhar... seu olhar era...
Perigoso como vidro quebrado.

Em ritmo frenético, ela checou a temperatura, respiração e pulso do menino. Parecia tudo bem, mas a face dele estava contraída em uma expressão de dor e seu rosto estava mortalmente pálido.

- Lyon! Minha bolsa! - a garota instruiu, irritada. Aquilo não era um pedido, mas uma ordem; uma das raras que Takane dava. Ela tirava o casaco rapidamente e o dobrava enquanto falava - Pegue um frasco onde está escrito "Haruka"! Rápido!

Ela colocou o travesseiro improvisado delicadamente sob a cabeça do menino e agarrou o pote em pleno ar, tirando uma esfera branca de seu interior basicamente no mesmo instante e a colocando na boca do menino inconsciente.
Aquilo era novidade no Distrito de Medicina. O remédio parecia açúcar, derretendo na boca. Ela não sabia do que era feito, mas fora prescrito para ela e Haruka da última vez que mudaram os medicamentos, no check-up de janeiro.
E agora ela rezava para que funcionasse em situações como aquela também.

Quanto tempo havia passado, ela se pergunta, de fato.
Apenas quando a expressão do guardião melhorou um pouco que Takane relaxou.

- Ainda bem... - havia grande alivio em sua voz - Ainda bem...! Ainda bem! Ainda bem!

E então ela corou, se lembrando que haviam outras pessoas ali. O filhote de lobo lançou um olhar assassino em direção a Lyon e Haku, encarando todos os quatro com uma expressão contrariada.

- O que estão esperando, seus imbecis!? - ela não conseguia disfarçar a felicidade direito, mas aquilo ainda soou extremamente ameaçador - Lyon, deixe a moto aqui e vá com Haku buscar alguma comida! Estávamos indo para uma casa que deve ter sido abandonada uns dois dias atrás quando vocês surgiram. Leve Anna se quiser. Arya-san... se você souber como tratar alguém nesse estado, me ajude por favor. Caso contrario, eu gostaria que você fosse com os meninos e com a Seto. Eu...
Eu preciso de um momento sozinha, ela complementou mentalmente.

- Ele está melhor...

Ela enxugou uma lágrima com a parte detrás do braço, sem tentar esconder os seus sentimentos. A simples visão do garoto daquela maneira lhe matava por dentro.

Murcha e sem cor, uma flor sussurrou...


Quando o coro das cigarras irritantes desapareceu, a menina comentou, baixinho;
- Por isso eu disse que eu não pude fazer nada - ela limpou o nariz, embora tentasse manter a dignidade - Eu sequer posso estar no lugar dele...

As sombras selvagens e ferozes estavam prestes a derramar. Naquele ciclo infinito e gelado, não havia nada, não havia uma última parada que ambos pudessem chegar juntos.


Os lábios dela batiam toda vez que o seu queixo tremia de leve. Mesmo naquele lugar, os dois podiam morrer.
Aquele era o tipo de injustiça que havia no mundo.

- Neh, Arya-san... - ela mordeu o lábio, preocupada. Ela simplesmente queria ficar sozinha, se enroscar em um cobertor e chorar.
Se levantando do lado de Haruka, ela foi até a bolsa e começou a reorganiza-la. Lagrimas rolavam pelo rosto de Takane quando ela começou a juntar as cartas espalhadas pelo chão e guarda-las na caixa de madeira. Verificando o cadeado, ela percebeu que estava quebrado.

Escondidas embaixo dos papeis, estava uma faca de lâmina afiada. Ela deixou escapar uma pequena exclamação de surpresa quando cortou o dedo.
- Você se importaria de ir com os meninos? Eu cuido de tudo aqui. Eu... eu já sei como lidar com os ataques de Haruka, então não se preocupe com ele. Apenas estou preocupada com Lyon. Se ele chamar atenção para nós...!

Takane sequer ousou acabar de falar. Mordendo o lábio novamente, ela engoliu a vontade de chorar e pegou a sua capa que havia sido jogada para fora da pequena mala, a ajeitando sobre o menino como um cobertor.

Ela não pode evitar se lembrar de um manto mortuário.

Toda vez que a menina o via dormir, um sentimento ambíguo tomava conta de seu coração.
Takane afastou delicadamente os cabelos dos olhos de Haruka, um meio sorriso em seu rosto.

Ela gostaria de saber qual era a verdade sobre aquele mundo.
Se você colhia apenas aquilo que plantava, a menina ansiava em saber quando haviam criado aquela semente de desespero.

Mesmo assim, não havia nenhuma saída, não importava onde procurassem.
Ela podia dizer adeus aquele corpo mortal, mas mesmo assim——!

- Ah, me lembrei de uma coisa - ela sussurrou, aproximando o seu rosto de dele. Qual era o problema dela, sendo capaz de sorrir mesmo com o garoto incapacitado daquela maneira? - Você provavelmente vai me achar repugnante e vai querer se afastar, mas...

Ela se lembrou porque gostava tanto de vê-lo dormir.
Haruka era um idiota. Ele dormia basicamente em qualquer lugar e sobrava para a garota deixa-lo em uma posição mais confortável ou arrasta-lo para o seu colo. Era bem fácil encontra-lo cochilando em bancos na Academia, então ela também tinha que espantar admiradoras que se aproveitavam do pobre coitado.

Ele parecia tão frágil e desprotegido daquela maneira, mas passava uma aura de tranquilidade. Também havia uma expressão que lembrava felicidade em seu rosto.

Aqueles dois sentimentos se mesclavam dentro dela. A vontade de abraça-lo e protegê-lo e o desejo de se curvar perante o próximo rei.
Não parecia, mas uma das características que Takane mais invejava em Haruka era a sua capacidade de liderança. Ele sempre parecia encontrar um acordo e fazer todos segui-lo por causa de seu carisma, já ela...

Mesmo assim, ela não podia deixar de pensar no garoto morto. Não seria muito diferente: o mesmo rosto pálido que lembrava demasiadamente o de uma garota, com o nariz que tinha uma curva suave e aquele pequeno sinal embaixo de seu olho que lembrava uma nódoa, além dos seus lábios que se separavam levemente quando ele espirava pela boca e os olhos cinzentos que a encaravam com uma mescla de surpresa e algo irreconhecível...

Quando ela percebeu o que esta tentando fazer... fazendo... ah, bem... Takane se afastou bruscamente e bateu a cabeça na árvore com uma exclamação de surpresa.
Com as mãos no local que havia sofrido a colisão e com diversos xingamentos escapando de seus lábios, a menina dobrou-se sobre o seu próprio corpo.

Seus rostos ficaram próximos novamente e ambos coraram.

- Me desculpe, eu não deveria...!

- Não, foi a minha culpa e...

Eles tentaram explicar a situação um para o outro por vários minutos, a voz sumindo por causa da vergonha e da confusão.

Os seus olhares se cruzaram com um batimento rápido e Haruka foi o primeiro a desvia-lo.
- Mas eu estou meio que feliz...

- I-Idiota! Não diga essas coisas quando você quase morreu! - havia uma nota perigosa em sua voz, os olhos com aquela expressão de vidro quebrado.
Ele sorriu e acariciou de leve o rosto da menina, se lembrando de seu sonho.

Chovia e algumas lagrimas tinham gosto de sal.
Ele havia dormido.
E então, nunca mais acordara novamente.

Haruka abraçou Takane com força, os cabelos dela roçando a sua face.
Ela cheirava bem. Livros novos, especiarias como pimenta e alguma coisa floral também. Atrás de tudo isso, havia o cheiro de algo que parecia ferro.

- Você me desculpa por te assustar assim?

- Não!

Ela sorriu. O menino se afastou levemente e beijou a testa dela.
- Eu só apaguei... não foi?

- Sim... eu acho. Não estava aqui na hora que começou e...
O rosto dela ficou pálido e ela se afastou mais uma vez. O garoto se sentou direito e a encarou, ligeiramente confuso.

- Droga, aqueles idiotas...

- Eles fizeram alguma burrice?

- Maiores que as suas, provavelmente. E-Ei!

Haruka se levantou. Takane agarrou o pulso dele com um olhar suplicante e ele o devolveu com um sorriso divertido. Ela nunca... nunca entenderia o problema com aquele garoto.

- Você deveria descansar.

- Ta-chan, olhe por esse lado - ele comentou, distraído, em seu tom doce e infantil. Por mais que ele fosse alto e realmente assustador quando estava sério, a voz dele lembrava bastante a de uma criança naquelas situações - Se eles se meterem em uma confusão, vão chamar a atenção dos militares. Se uma ordem de busca por você, por mim ou pelos Pheles tiver sido emitida, eles vão capturar a Arya e o Lyon e depois vão vir atrás de você. Por mais que a Takane seja poderosa, eu realmente duvido que você consiga dar conta de todas as pessoas sem matar uma ou outra na empolgação, então você vai ter que se suprimir e eles vão te pegar. E a proposito, o Egil é demais para você; eu tive sorte que você e o Lyon criaram a distração perfeita. Então, você vai ser obrigada a se casar e eu realmente não quero ter que assassinar uma das mais poderosas famílias da atualidade no meio da noite para te libertar. Então, podemos, por favor, impedir seja lá quem seja de fazer a maior burrice do mundo que vai atrapalhar bastante a minha vida e a sua também?

- ...
Ela meio que estava impressionada com a velocidade que ele havia dito aquilo. O menino arfou profundamente, tentando recuperar o folego.
Era incrível ou coisa assim; cinco minutos atrás, ele estava inconsciente e em estado critico. Agora, provavelmente estava tramando o assassinato de um dos homens mais poderosos do mundo e pensando no futuro de Takane.

A menina suspirou.
Ela tinha que ter uma séria conversa com Arya sobre se subestimar quando as duas se encontrarem.

Haruka estendeu a mão e ela a pegou, o usando para se levantar também.